O decreto 8.038 regulamenta o Programa Cisternas,
que prevê garantias de fornecimento de água para consumo humano e para produção
de alimentos. Os beneficiados serão integrantes de famílias de baixa renda da
zona rural atingidas pela seca ou que sofram com falta regular de água. O texto
altera artigos da norma que criou o Programa Água para Todos e institui dois
comitês administrativos, sendo um gestor e outro operacional, ambos formados
por integrantes de ministérios e representantes de trabalhadores rurais.
Com o Programa Um Milhão de Cisternas, criado em
2003, o governo pretendia levar cisternas a todas as famílias do semiárido até
2008, a fim de minimizar os efeitos das secas. O Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS) informa que apoiou a implementação de 584.282
cisternas de placa na região Nordeste, em parceria com estados, municípios e
organizações da sociedade civil, número pouco maior que a metade do previsto.
Apenas em 2013, foram 37.374 até junho.
Como a meta não foi cumprida, em 2011 foi criado o
programa Água Para Todos, com objetivo de entregar 750 mil cisternas até o fim
de 2014, com custo previsto de R$ 2,9 bilhões. Até o momento, 320.370 cisternas
foram entregues, 42% da meta, de acordo com o Ministério da Integração.
O Água Para Todos é voltado para famílias
residentes nas áreas rurais do semiárido, com acesso precário à água, inscritas
no Cadastro Social Único do Governo Federal e com renda familiar per capita de
até R$ 140 mensais, além de aposentados que vivam exclusivamente da renda
previdenciária.
Segundo o cadastro único, cerca de 770 mil famílias
se enquadram hoje nessa exigência no semiárido. O Ministério do Desenvolvimento
Social diz que há, atualmente na região, 1.134 municípios que possuem cisterna
e 43 municípios que estão em fase de contratação – uma cobertura de 97%.
Ainda assim, em razão da seca persistente, mesmo as
famílias que possuem as cisternas têm o acesso à água restrito. Segundo o
governo, não é possível saber se todas as cisternas estão sendo abastecidas.
"O objetivo é que não [fiquem desabastecidas],
mas daqui de Brasília não consigo te garantir isso. Não me pede para botar meu
CPF nesse negócio", afirma ao G1 Francisca Rocicleide
Ferreira da Silva, diretora do Departamento de Fomento à Produção e à
Estruturação Produtiva da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional do MDS.
A dependência dos carros-pipa, no entanto, faz com
que o governo acredite que, mesmo com as cisternas, muitas famílias estejam sem
água. "O carro vai preenchendo as cisternas, vai num lugar, não vai no
outro. Tem comunidades muito isoladas. A gente tem uma expectativa de que a
partir de outubro deste ano chegue a chuva. Enquanto isso não acontece, não tem
como garantir", diz Silva.
Cristina Nascimento, coordenadora executiva da
Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) no Ceará, afirma que o programa de
cisternas é um avanço, mas ressalta que é preciso acelerar o processo. "A
cisterna tem um peso muito importante na vida dessas famílias, que são as mais
pobres, que mais sofrem. São famílias que moram em áreas com pequenos
barreiros, pequenos poços e não têm agua de qualidade para consumo
humano", afirma.
"Se essas famílias não têm cisterna, elas não
têm onde estocar a água. Além disso, ela é um equipamento que gera cidadania,
porque é construída em comunidade, com os próprios meios. Ela tem um peso muito
importante", completa.
Segundo Cristina, no entanto, a maior reclamação é
a distribuição inconstante de água pelos carros-pipa. "A água chegou, mas
não chegou em quantidade. Falta um planejamento dos órgãos públicos."
Cisterna vazia em Alagoas
Em Olho d'Água das Flores, no sertão alagoano, cidade com pouco mais de 15 mil habitantes, os moradores contam que chegam a ficar de uma semana a seis meses sem água. A seca atinge cerca de 40% da população na zona rural.
Em Olho d'Água das Flores, no sertão alagoano, cidade com pouco mais de 15 mil habitantes, os moradores contam que chegam a ficar de uma semana a seis meses sem água. A seca atinge cerca de 40% da população na zona rural.
Segundo a Secretaria Municipal de Agricultura, 600
famílias vivem sem cisternas ou água encanada na região. Das 227 cisternas
instaladas, apenas 39 cadastradas recebem água dos carros-pipa – 24 pela
prefeitura em parceria com a Defesa Civil e outras 15 pela Operação Pipa do
Exército. As demais ficam vazias se não chover.
A dona de casa Creuza Gomes da Silva, de 37 anos,
moradora do sítio Craíbas, diz que metade das casas tem água encanada, mas que
na dela não há nem sequer torneira. Ela busca água no "chafariz",
como os moradores apelidaram uma torneira coletiva da rua. "Todo ano é a
mesma coisa. Vivo desde que nasci aqui e, nesse tempo, nada muda", diz.
Quando falta água no "chafariz", os
filhos vão buscar em uma barragem que fica a cerca de 1 quilômetro dali. Mas
dura pouco. "Pego alguns baldes de água pela manhã e à tarde já estamos
precisando de novo", relata.
A água serve para a família beber, lavar louça e
tomar banho. A pequena horta de feijão secou. "Falta água, comida, mas a
gente se vira. Um ajuda o outro."
É a pior seca em mais de 50 anos. Antes ainda
chovia, mas este ano a chuva é pouca. A última vez foi há mais de trinta
dias"
Ana Paula Rodrigues Fernandes, secretária municipal de Agricultura de
Olho d'Água das Flores (AL)
Perto dali, a agricultora Maria Madalena Ferreira
Silva, de 30 anos, grávida, vive com o marido em uma pequena propriedade rural.
Ela toma água da cisterna da vizinha, que leva em baldes na cabeça de duas a
três vezes por dia. "Agora que estou com oito meses, trago pouca
água", conta.
O pequeno poço escavado ao lado da casa está vazio.
"Só serve para acumular sujeira que as pessoas passam e jogam. Construímos
para encher de água, mas isso nunca aconteceu", diz ela.
"Este ano foi muito pior. Até o feijão que
plantamos no quintal não vingou. Não sei como vai ser se isso continuar",
conta Madalena sobre a seca, "mais severa". Ela diz não ter
esperanças de ter água encanada ou uma cisterna em casa. "Não sei nem a
quem pedir isso."
"A gente cadastra algumas cisternas e os
vizinhos vão buscar lá. Foi a maneira que encontramos de suprir a necessidade
de todos", afirma a secretária municipal, Ana Paula Rodrigues Fernandes.
"É a Defesa Civil quem faz esse abastecimento. Se não fosse assim, não
teria como. É a pior seca em mais de 50 anos. Antes ainda chovia, mas este ano
a chuva é pouca. A última vez foi há mais de trinta dias."
Indústria da
seca
Outro problema apontado pela ASA é a preferência do Ministério da Integração por cisternas de "plástico", pré-fabricadas de polietileno, em vez das de placa, entregues pelo MDS, construídas com cimento. "Isso beneficia grandes grupos. Como o governo faz opção por uma cisterna que não gera renda e custa duas vezes mais? É a reedição da indústria da seca", critica Cristina.
Outro problema apontado pela ASA é a preferência do Ministério da Integração por cisternas de "plástico", pré-fabricadas de polietileno, em vez das de placa, entregues pelo MDS, construídas com cimento. "Isso beneficia grandes grupos. Como o governo faz opção por uma cisterna que não gera renda e custa duas vezes mais? É a reedição da indústria da seca", critica Cristina.
Segundo a coordenadora, as cisternas de plástico
são "pronta-entrega", mas acabam estocadas em galpões porque não há
mão-de-obra para entrega. "Compram em nome dessa pretensa agilidade, mas
elas não estão nas casas das famílias. Já chegam deformadas porque não aguentam
o calor. Por enquanto não conseguimos barrar isso", diz. "Com uma de
plástico guardada, construímos duas de placa. Demora mais, mas vale mais."
Em nota, o Ministério da Integração informa que não
apenas vai continuar usando as cisternas de plástico, como também vai ampliar a
implantação no segundo semestre de 2013. “As cisternas de polietileno não
deformam ou derretem em função de altas temperaturas”, diz a pasta em nota.
Segundo o ministério, o custo da cisterna de placa
é entorno de R$ 2.200 e da cisterna de polietileno é de R$ 5.090. Mas diz que a
de polietileno, com 16 mil litros de água para atender uma família de cinco
pessoas por até seis meses, tem tempo de vida útil de mais de 30 anos, podendo
ser implantada em um dia.
“A construção e instalação das cisternas são
coordenadas por comitês municipais, que incluem treinamento e capacitação dos
beneficiários”, diz o Ministério da Integração Nacional. “As cisternas que, por
ventura, apresentarem defeitos de fabricação estão sendo imediatamente
substituídas, conforme contrato, sem custos para o governo federal e os
beneficiários do programa.”
Busca ativa
Segundo o governo, o programa Água para Todos tem como objetivo garantir o amplo acesso à água para as populações rurais dispersas e em situação de extrema pobreza, para o consumo próprio e para a produção de alimentos e a criação de animais.
Segundo o governo, o programa Água para Todos tem como objetivo garantir o amplo acesso à água para as populações rurais dispersas e em situação de extrema pobreza, para o consumo próprio e para a produção de alimentos e a criação de animais.
Segundo a diretora do MDS, quando o cadastro for
finalizado, com entrega de cisternas a todas as famílias, deve ser iniciada uma
busca ativa por aquelas que não se cadastraram para receber as cisternas.
"O governo considera que as ações do programa
a partir do cadastro estabelecem uma finalização da extrema pobreza no acesso à
água", afirma.
Além das cisternas de consumo e de produção, o
governo também informou que está implementando sistemas coletivos de
abastecimento para consumo humano, pequenos sistemas de irrigação e pequenas
barragens de água pluvial. O investimento total previsto é de aproximadamente
R$ 4,7 bilhões.
Para a coordenadora da ASA, se a meta de cisternas
para consumo humano for cumprida em 2014, o próximo passo deve ser garantir
água para produção, chamada "segunda água". "É fazer essas
famílias poderem produzir seu próprio alimento, convivendo com o que o
semiárido tem a oferecer", conclui.
Fonte: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2013/07/governo-estima-que-429-mil-familias-nao-tem-cisternas-no-semiarido.html
A Professora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Mensagens ofensivas ou consideradas inapropriadas serão excluídas.